Segmentação no e-commerce – Necessidade e estratégia
Segmentação de mercado é uma estratégia de marketing que parte de uma premissa básica: nenhum indivíduo é igual a outro e é impossível agradar todo o público com um só produto. A solução encontrada para esses casos é a divisão do mercado consumidor em diferentes segmentos, criando mercados-alvo que posteriormente se desdobrarão em públicos-alvo e posicionamentos.
Mas nem sempre o processo obedece essa ordem. Em geral, pequenos negócios descobrem o segmento ideal por tentativa e erro. Através do comportamento do consumidor, da gestão de estoque e dos registros de compras, pouco a pouco o lojista se ajusta à demanda de uma clientela específica, atuando em pequenos segmentos conhecidos como nichos de mercado.
Segmentação de mercado é importante para empresas de todos os portes
As poucas empresas que não segmentam os seus produtos ou serviços fazem o chamado marketing de massa. Geralmente, essas companhias trabalham com commodities, como petróleo, açúcar, feijão e bens cuja demanda vai existir independentemente de uma alteração no preço (demanda inelástica). Seus clientes não têm percepção de valor e as empresas não possuem mix de produtos que possam variar entre diferentes segmentos.
Porém, se você não vende commodities, não importa se atende um nicho (calçados de skate, por exemplo) ou um mercado completo (como a Netshoes). Fazer a correta segmentação ou encontrar o seu nicho de mercado é o que vai guiar o posicionamento da marca, ajudar a definir o público-alvo e a fazer investimentos em comunicação mais precisos. A seguir, conheça os níveis de segmentação e estratégias usadas no marketing.
Níveis de segmentação de mercado:
- Um segmento: mercado de nicho, esforços centrados em um pequeno segmento com público-alvo bem definido e pouca concorrência.
- Dois ou mais segmentos: estratégia diferenciada com esforços concentrados em 2 ou mais segmentos, público-alvo específico.
- Centenas ou milhares de segmentos: marketing one-to-one com foco em customização.
Estratégias de segmentação de mercado
A segmentação de mercado costuma seguir um processo em três etapas, conhecido pela sigla STP. Essas iniciais designam:
Segmentação (segmentation) > Público-alvo (targeting) > Posicionamento (positioning).
Em cada uma das etapas da construção do posicionamento da sua marca existem ações a serem desmembradas. Como você pode perceber no fluxo acima, o público-alvo é uma etapa posterior à segmentação, fruto do cruzamento de variáveis demográficas, culturais, psicológicas e comportamentais que definem o perfil do seu consumidor. O processo seguinte é o posicionamento da marca, que vai ditar os caminhos da comunicação persuasiva.
O objetivo da segmentação é encontrar o mercado-alvo e revelar oportunidades de negócios ainda não percebidas. Conheça abaixo os tipos mais populares de segmentação e as respectivas fontes para coleta de dados relevantes.
1. Segmentação demográfica
Segmentação de mercado de acordo com variáveis demográficas do consumidor como renda, idade, tamanho da família e classe social. A segmentação demográfica assume que consumidores com perfis similares terão os mesmos padrões de consumo, motivações, interesses e estilos de vida. Por isso, tais características serão traduzidas em preferências semelhantes por marcas e produtos.
Quando a intenção é segmentar públicos consumidores em grandes centros urbanos ou em um país (como é o caso dos e-commerces), é possível ter insights a partir do censo populacional. O censo divulga dados gratuitos e segmentados por Estado ou centro urbano a respeito de médias de idade, nível de escolaridade, renda e tamanhos das famílias, por exemplo.
Principais critérios da segmentação demográfica: idade, sexo, renda, número de integrantes da família, número de dependentes, tipo de moradia, profissão, escolaridade, locomoção e deslocamentos, estado civil, estágio da vida, religião, etnia, geração e classe social.
Mesmo fazendo parte do Grupo Boticário, as lojas Quem disse, Berenice? optaram pela segmentação por gênero, direcionando a comunicação da marca exclusivamente às mulheres – claramente por conta do produto que vendem. Ainda assim, esse processo é um tipo de segmentação demográfica. Estilo, cores, o nome de mulher na marca e o uso de mulheres em todas as comunicações são diretrizes que guiaramo processo de segmentação e posicionamento das lojas.
Outra questão presente na comunicação da marca é o foco na venda direta de cosméticos e maquiagem para classes sociais e faixas etárias diferentes das que consomem produtos O Boticário, fato que também pode ser percebido pela comunicação.
2. Segmentação geográfica
A segmentação geográfica divide os mercados de acordo com critérios específicos que podem abranger países, regiões, estados, cidades ou bairros, como também abordar questões populacionais e climáticas, como o tamanho da cidade, densidade populacional ou clima. É comum que esse tipo de dados seja associado à segmentação demográfica, criando o que é chamado de geo-cluster ou segmentação geodemográfica. Com a associação desses dois níveis de segmentação, obtêm-se dados mais ricos e detalhados sobre os mercados-alvo.
O modelo geodemográfico parte da premissa de que grupos ou residências situadas no mesmo bairro ou região, por exemplo, têm propensão maior a exibir similaridades em sua composição demográfica e em diversas outras características relativas aos agregados familiares.
Um exemplo malsucedido de segmentação geográfica aconteceu – e ainda acontece – com a Euro Disney, localizada na França. A região possui clima mais frio do que o parque de Miami, que atrai visitantes em todas as épocas do ano. Porém, na Europa, o frio do inverno impacta drasticamente na frequência do parque durante 6 meses do ano, condicionando o parque à sazonalidade. Como resultado, o sucesso da Euro Disney é comprometido.
O break even (equilíbrio financeiro) do parque só é atingido se o fluxo de visitantes for de 15 milhões de turistas anuais. Dados passados apontam que o parque tem atingido, em média, 14,1 milhões, ao contrário da sede em Orlando.
Pequenos negócios costumam não atravessar tantas fronteiras, mas o exemplo serve para ilustrar as diferenças geográficas que podem existir inclusive no Brasil. Imagine que você comercializa produtos de moda praia – talvez não seja uma boa estratégia promover seus produtos em regiões mais continentais e afastadas do litoral.
3. Segmentação comportamental
É a segmentação por ocasião de uso e compra que tem como foco a análise das situações em que o consumidor está inclinado a adquirir ou consumir determinado produto. Essa abordagem providencia um entendimento das necessidades individuais do consumidor, comportamentos e valores de acordo com diferentes ocasiões de uso.
Ao contrário dos modelos tradicionais, a segmentação comportamental é capaz de incluir o mesmo consumidor em mais de um segmento dependendo das circunstâncias em que ele se insere. A Cadbury, marca inglesa de chocolates, segmentou o seu mercado em quatro grupos baseada em usos e comportamentos de compra:
- Consumo imediato (34%): guiado pela necessidade de “beliscar” algo rápido para repor as energias. Produtos que servem a essas motivações incluem marcas como KitKat e barrinhas Mars.
- Consumo em casa (25%): motivado pela necessidade de ter algo na despensa para dividir com a família assistindo à televisão ou para lanches em casa. Produtos que atendem essas necessidades são os chocolates em barras e os packs promocionais.
- Crianças (17%): necessidade de consumir produtos no lanche da escola, após as aulas ou em festas infantis. Milky Bar e Smarties atendem esse segmento.
- Presentes (15%): produtos comprados como presentes que contêm um pequeno cartão ou espaço para mensagem ao consumidor final do produto. São consumidos em ocasiões especiais ou situações românticas. Os produtos que atendem a essa demanda são as caixas especiais, como Cadbury’s Roses ou Quality Street.
- Sazonal (3,4%): motivação baseada na necessidade de dar um presente ou criar atmosfera festiva. Esses produtos são principalmente adquiridos em períodos como Natal e Páscoa.Mesmo que a sua loja virtual não venda chocolates como a Cadbury, é importante entender as ocasiões de compra para definir padrões e grupos entre os seus consumidores. A análise comportamental é especialmente interessante para quem já tem um negócio e pretende descobrir quais mercados se encaixam em determinados comportamentos – a aba Behavior do seu Google Analytics pode fornecer alguns desses insights.
Abaixo, conheça diferentes variáveis comportamentais que podem servir como base para estruturar a segmentação de mercado da sua marca:
- Ocasião de compra/consumo: ocasiões regulares, festivas, especiais e para presentear.
- Benefício percebido: economia, qualidade, nível de serviço, conveniência e acessibilidade.
- Status do consumidor: não usuários, ex-usuários, usuários potenciais, usuários iniciantes e usuários regulares.
- Status da fidelidade: fiéis convictos, fiéis divididos, fiéis inconstantes e infiéis.
- Frequência de compra e uso: light-user (pouco frequente), middle-user (razoavelmente frequente) e heavy-user (muito frequente).
- Perfil atitudinal: entusiasta, positivo, negativo, indiferente e hostil.
- Estágio de interesse: consumidor precoce, consumidor tardio ou consumidor atrasado.
4. Segmentação psicográfica
A segmentação psicográfica utiliza recursos da psicologia para compreender melhor os consumidores. Nesse tipo de segmentação de mercado, os consumidores são divididos de acordo com os seus estilos de vida, personalidade e valores. Isso faz com que indivíduos que compartilham o mesmo perfil psicográfico não tenham necessariamente o mesmo background geodemográfico.
Nos Estados Unidos, a análise de segmentação de mercado psicográfica mais utilizada é a VALS, sigla que designa as iniciais para Values and Lifestyles Segments(segmentação por valores e estilos de vida). Embora o método seja utilizado em outros países, como o Japão, os critérios utilizados para dividir grupos de consumidores são significativamente diferentes.
No Brasil, um dos modelos de segmentação psicográfica disponíveis é o Painel Mosaic do Serasa Experian. Nele, o consumidor brasileiro foi dividido em 11 grupos e, dentro deles, 40 subgrupos diferentes que abrangem desde a população rural até os habitantes de elite dos grandes centros urbanos. Confira abaixo os grupos e subgrupos:
- A – Elites brasileiras: ricos e influentes e elite urbana qualificada.
- B – Experientes urbanos de vida confortável: idosos tradicionais de alto padrão, a caminho da aposentadoria nas grandes cidades e assalariados de meia-idade das grandes cidades.
- C – Juventude trabalhadora urbana: construindo uma carreira promissora, jovens dependentes do interior e jovens protagonistas da classe média.
- D – Jovens da periferia: seguindo a vida na periferia, no coração da periferia, novos moradores da comunidade, trabalhadores vizinhos das grandes cidades, independência na casa dos pais e juventude de baixa renda do interior urbano.
- E – Adultos urbanos estabelecidos: esticando a renda, amadurecendo confortavelmente no interior, ascendentes do bairro e operários da vila.
- F – Envelhecendo no Séc. XXI: idosos independentes da classe média, “jovens” idosos urbanos e dinâmicos e idosos remediados do interior.
- G – Donos de negócio: empresários estabilizados, jovens empreendedores e ousados e pequenos negociantes do interior.
- H – Massa trabalhadora urbana: carteira assinada nas regiões metropolitanas, trabalhadores manuais de baixa remuneração, prestadores de serviços nas regiões metropolitanas, jovens da informalidade e comunidades do litoral.
- I – Moradores de áreas empobrecidas do Sul e Sudeste: envelhecendo com simplicidade, periferia jovem do interior e comunidade madura.
- J – Habitantes de zonas precárias: jovens desprovidos e adultos vulneráveis.
- K – Habitantes das áreas rurais: pedacinho de terra, jovens trabalhadores do agronegócio, saudades da roça, juventude do Norte e Nordeste rural, idosos da agricultura familiar do Norte e Nordeste e sertão profundo.
5. Segmentação cultural
A cultura é o conjunto de valores de um povo que não necessariamente está localizado na mesma região geográfica – um exemplo prático disso é a cultura cigana, carregada para todos os lados do globo entre os seus descendentes. Não é à toa que a segmentação cultural é uma das mais complexas. Como padronizar ou escalonar valores para cada cultura? O psicólogo da IBM Geert Hofstede tentou encontrar os valores e pontos de contato entre culturas de diferentes povos para estabelecer comparações.
Para tal, Hofstede valeu-se de 6 dimensões: distância do poder, individualismo, masculinidade, propensão ao risco, indulgência e orientação a longo prazo. As pontuações para cada categoria vão de 0 a 100 e dão insights sobre o conjunto de valores que compõem uma cultura, independentemente da sua diversidade.
No site do Instituto Geert Hofstede é possível comparar a cultura de dois países de acordo com essas dimensões. Abaixo, veja uma comparação entre os valores brasileiros e portugueses:
Para ilustrar como as diferenças culturais podem ter impacto negativo no posicionamento da sua marca, vamos falar a respeito de um caso de segmentação geográfica malsucedido ocorrido no lançamento das fraldas Pampers no mercado japonês, em 1961.
Toda a comunicação de massa da marca no ocidente tinha como referência a lenda da cegonha que traz os bebês. Por conta da falta de conhecimento de questões culturais, a mesma peça publicitária foi veiculada nos meios de comunicação japoneses durante o lançamento.
Você pode não ter notado nenhuma falha nessa estratégia de comunicação. Mas os japoneses simplesmente não entenderam a mensagem. Para os japoneses, a cegonha não significa nada, já que a mitologia oriental conta que os bebês vêm do repolho. Nesses casos, a segmentação de mercado cultural faz toda a diferença para o lançamento de um produto.
Mas não é preciso ir até o Japão para ilustrar essa situação: um vendedor de mate para chimarrão provavelmente terá mais sucesso no Sul do Brasil do que em São Paulo, por exemplo.
Fontes de dados para segmentação de mercado
Como você pode perceber, a segmentação de mercado é o primeiro passo para a definição de mercados-alvo, que fornece os dados secundários necessários para encontrar seu público-alvo e, posteriormente, posicionar sua marca. Conheça algumas fontes de dados citadas neste artigo:
Externas
- Pesquisas encomendadas em grandes companhias como os Insights da Nielsenou o painel Mosaic do Serasa Experian.
- Órgãos do governo (IBGE, Procon e secretarias) ou associações privadas e dados do Censo demográfico.
- Relatórios semestrais Webshoppers da e-Bit.
- Pesquisas de mercado, como a 3ª Pesquisa Nacional do Varejo Online, desenvolvida pelo Sebrae em parceria com o E-commerce Brasil.
Internas
- Cruzamento de dados cadastrais dos clientes (Customer Relationship Management ou CRM).
- Pesquisas criadas, distribuídas e analisadas in-house.
- Google Analytics.
- Análise Cohort.
Você sabe de onde vêm e quais são os hábitos dos seus clientes? Quão importante é a segmentação de mercado para o seu negócio? Sua opinião será sempre bem-vinda nos comentários.
Referências: mandae.